Festividade do Glorioso São Sebastião do Marajó no Patrimônio Cultural Brasileiro


imagem centenária cultuada pela Irmandade do Glorioso São Sebastião, em Cachoeira do Arari, na ilha do Marajó.


NOTÍCIA AUSPICIOSA A TODOS MARAJÓS DAS ILHAS E DA TERRA FIRME
O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), publicou no Diário Oficial da União de 04.10.2013, AVISO do Registro da Festividade do Glorioso São Sebastião na Região do Marajó no Patrimônio Cultural Brasileiro. A curadoria desta tradição marajoara é realizada pela Irmandade do Glorioso São Sebastião (IDGSS) que irá comemorar o acontecimento com todos parceiros que contribuíram para o referido Registro Nacional.
"A festa em homenagem a São Sebastião na cidade de Cachoeira do Arari, segundo relatos de moradores da cidade, acontece há mais de 100 anos. É uma das mais expressivas da ilha do Marajó e reúne de 10 a 20 de janeiro, pessoas de todos os cantos, do Pará e de outros estados do Brasil. Embora  o dia do Santo seja dia 20 de Janeiro, a preparação da festa começa seis meses antes, em Julho, quando um grupo de foliões começa a percorrer casas, fazendas e retiros da região, rezando ladainhas em latim e cantando folias na chamada "esmolação", com o fim de arrecadar recursos e donativos para os dias de festa.

São percorridos retiros e fazendas nos municípios de Cachoeira do Arari, Ponta de Pedras, Santa Cruz do Arari e Chaves. No itinerário são visitadas mais de duzentas localidades, a cavalo ou de barco. A comissão é constituída por violeiros, tamborineiro e bandeireiro e tem como repertório músicas em reverência ao Santo. 


As folias constituem um repertório ligado a procissão que a Comissão faz durante o período da esmolação; suas letras geralmente glorificam o Santo e pedem licença para entrar nas casas visitadas por ele. A ladainha por sua vez está ligada às devoções familiares e é rezada em frente ao Santo; é cantada em latim, nas novenas nas casas das pessoas e no final da festa. As marchinhas são tocadas pela  banda de música, durante o período em que os mastros caminham pela cidade para serem levantados (dia 10) e depois derrubados (dia 20)."
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Fonte: FOLIAS DE SÃO SEBASTIÃO - IPHAN




CONTEXTO HISTÓRICO E CULTURAL DA TRADIÇÃO:
parceria de Santo Antônio e São Sebastião na conquista das Amazonas (sem esquecer de São Pedro e São Benedito).

Vem de muitas datas o culto do santo milagroso que passou à cultura luso-brasileira com tanta força, a bem dizer, com o descobrimento do Brasil e a luta entre lusos e franceses na conquista da baía da Guanabara, culminando com o milagre e aliança do destemido cacique Arariboia, que ao lado de Estácio de Sá, com tão poucas armas fez em nome de Portugal o vencedor e fundador da cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro, em 1º de março de 1585.

Na ilha do Marajó o culto de São Sebastião é tardio em relação a sua devoção no Brasil colonial. Mas, curiosamente, o Sebastianismo chegou aqui antes do culto a São Sebastião quando em Portugal foi ao contrário. Pois, como se deve saber, a invenção da Amazônia há 400 anos é uma aventura portuguesa, com certeza, movida a sebastianismo dentro da União Ibérica (1580-1640): compensação cultural à tragédia histórica da morte de Dom Sebastião (Lisboa (Portugal), 20/01/1554 - Alcácer Quibir (Marrocos), 04/08/1578). 

E a conquista portuguesa de Mariocai (Gurupá), em 1623, foi atribuída ao milagre de Santo Antônio por intermédio dos frades do convento do Una no recrutamento de arcos e remos Tupinambás, donde a homenagem ao santo português com o forte de Santo Antônio de Gurupá. Todavia esta conquista e até mesmo a entrada pioneira de Pedro Teixeira, de Belém do Pará a Quito (Equador), de 1637 a 1639, não teria futuro se houvesse fracassado a missão pacificadora da Companhia de Jesus junto aos invencíveis inimigos Nheengaíbas - senhores das ilhas desde o passado remoto - como explica em detalhes o Padre Antônio Vieira.

Ora, o Sebastianismo foi promotor da restauração da independência de Portugal (1º de dezembro de 1640) e, por extensão, da conquista do Maranhão aos franceses (1615), passando pela expulsão dos Hereges (protestantes) holandeses e britânicos (1623-1647) durante 44 anos de guerra até as pazes de Mapuá (Breves), a 27 de agosto de 1659.

Da jornada das pazes dos Nheengaíbas só temos o teatro barroco do "payaçu dos índios". Este teatro parece ser ato contínuo da carta "As Esperanças de Portugal", escrita em viagem à aldeia Camutá-Tapera (Cametá) quatro meses antes da viagem a Mapuá. Aos olhos racionalistas de hoje o relato é, em grande parte, inverossímil... Mas aí que iluministas e positivistas se enganam: carece embarcar no espírito de época (século XVII). 

E, neste caso, a prova material do "milagre" de Santo Antônio é o forte de Gurupá, enquanto que as pazes dos Nheengaíbas sob as graças do Sebastianismo se provam na sua imediata consequência: o acordo dos ditos índios inimigos em fundar as aldeias jesuíticas - no mesmo ano de 1659 - , na terra firme disputada pelos guerreiros Tupinambás; de Aricará [Melgaço] e Aracaru [Portel] a partir de 1758, sob o Diretório dos índios (1757-1798) anti-jesuítico.

Ainda falta interesse acadêmico suficiente para a educação nacional se empoderar da amazonidade. O papel histórico do Padre Antônio Vieira na consolidação da posse portuguesa no Grão-Pará, ruptura da "linha" de Tordesilhas e adesão dos Nheengaídas à causa Sebastianista (cerne do Quinto Império do Mundo ou Reino de Jesus Cristo consumado na terra) a par dos direitos humanos dos povos indígenas é, evidentemente, chave para o entendimento atual da Festividade de São Sebastião. Em boa hora registrado pelo IPHAN no Patrimônio Cultural Brasileiro.

Seja este ato oficial entendido como um chamado federativo à boa convivência entre todos e todas. Sabemos que na cultura marajoara nem tudo são flores. A integração precisa ser algo mais que um discurso, como a democracia não pode ser uma concha vazia (na lição de vida de Nelson Mandela).

É óbvio que a religião dos Tupinambás (apud Florestan Fernandes e muitos outros), com a utopia selvagem da Terra sem mal, explica a fundamental presença do "bom selvagem" na invenção da Amazônia. A catequese dos índios do Marajó, a mestiçagem cultural a partir de casamentos entre índias e colonos portugueses, índios e escravas negras, o amasio dos brancos com negras e índias cativas. Tudo isto, nas condições ecológicas e geográficas do isolamento insular num arquipélago de 2.500 ilhas, aproximadamente, varrido por surtos de peste de bexigas (varíola), febre amarela, malária, sarampo, episódios de fome, doenças que devastavam os rebanhos inclusive; predispôs ao pedido de socorro ao Glorioso São Sebastião.

O crente acredita em milagre e o não-crente acredita na resiliência da natureza e da vida. Uma coisa e outra talvez estejam mais próximas da realidade do que, geralmente, se crê. 

 CATOLICISMO E SINCRETISMO

São Sebastião nasceu em Milão, na Itália, de acordo com Santo Ambrósio, por volta do século III, embora haja versões de que tenha nascido em Narbonne, na França. Pertencente a uma família cristã, foi batizado em criança. Mais tarde, tomou a decisão de engajar-se nas fileiras romanas e chegou a ser considerado um dos oficiais prediletos do Imperador Diocleciano. 

Contudo, nunca deixou de ser um cristão convicto e ativo. Fazia de tudo para ajudar os irmãos na fé, procurando revelar o Deus verdadeiro aos soldados e aos prisioneiros. Secretamente, Sebastião conseguiu converter muitos pagãos ao cristianismo. Até mesmo o governador de Roma, Cromácio, e seu filho, Tibúrcio, foram convertidos por ele.

Em certa ocasião, Sebastião foi denunciado, pois estava contrariando o seu dever de oficial da lei. Teve, então, que comparecer ante o imperador para dar satisfações sobre o seu procedimento.
Diante do Imperador, Sebastião não negou a sua fé e foi condenado à morte, sem direito à apelação. Amarrado a um tronco, foi varado por flechas, na presença da guarda pretoriana. No entanto, uma viúva chamada Irene retirou as flechas do peito de Sebastião e o tratou.

Assim que se recuperou, demonstrando muita coragem, se apresentou novamente diante do Imperador, censurando-o pelas injustiças cometidas contra os cristãos, acusando-o de inimigo do Estado. Perplexo com tamanha ousadia, Diocleciano ordenou que os guardas o açoitassem até a morte. O fato ocorreu no dia 20 de janeiro de 288.

São Sebastião é um santo muito popular e padroeiro do município do Rio de Janeiro, dando seu nome à cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro. Reza a lenda que, na batalha final que expulsou os franceses que ocupavam o Rio, São Sebastião foi visto de espada na mão entre os portugueses, mamelucos e índios, lutando contra os franceses calvinistas. Além disso, o dia da batalha coincidiu com o dia do santo, celebrado em 20 de janeiro. São Sebastião é o protetor da humanidade contra a fome, a peste e a guerra.


                                 Na Umbanda, São Sebastião corresponde a Oxóssi

Oxóssi é o orixá masculino iorubá responsável pela fundamental atividade da caça. Por isso na África é também cultuado como Ode, que significa caçador.

No Brasil, o orixá tem grande prestígio e força popular, além de um grande número de filhos, recebendo o título de Rei das Matas. Seus símbolos são ligados à caça: no candomblé, tem um ou dois chifres de búfalo dependurados na cintura. Na mão, usa o eruquerê (eiru), que são pelos de rabo de boi presos numa bainha de couro enfeitada com búzios.

O filho de Oxóssi apresenta arquetipicamente as características atribuídas ao orixá. Representa o homem impondo sua marca sobre o mundo selvagem, nele intervindo para sobreviver, mas sem o alterar. Oxóssi desconhece a agricultura, não muda o solo para plantar, apenas recolhendo o que pode ser imediatamente consumido: a caça.

No tipo psicológico a ele identificado, o resultado dessa atividade é o conceito de forte independência e de extrema capacidade de ruptura, o afastar-se de casa e da aldeia para se embrenhar na mata a fim de caçar.

Geralmente Oxóssi é associado às pessoas joviais, rápidas e espertas, tanto mental como fisicamente. Tem portanto, grande capacidade de concentração e de atenção, aliada à firme determinação de alcançar seus objetivos e a paciência para aguardar o momento correto para agir. Buscam preferencialmente trabalhos e funções que possam ser desempenhados de maneira independente, sem ajuda nem participação de muita gente, não gostando do trabalho em equipe. Ao mesmo tempo, é marcado por um forte sentido de dever e de uma grande noção de responsabilidade. Afinal, é sobre ele que recai o peso do sustento da tribo.


Fonte:
Os Orixás, Editora Três

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