EXISTE DE FATO A UNIVERSIDADE DA MARÉ?





Não é fácil estabelecer diálogo entre rústicos portadores do "conhecimento tradicional" e nobres representantes da "intelligentsia" emergente, de um país como o nosso, malmente descolonizado. Só pouco a pouco se irá estabelecer a ponte comum por onde pajés, babalorixás, rezadeiras e curadores em geral poderão transitar sem risco de ser enxotados do pedaço e PhD's poderão puxar conversa com os ditos sem desmerecer a alta filosofia que, certamente, alcançaram com sacrifícios pessoais por anos a fio.

Por isto, este blogue caboco sente-se no dever de repisar seu velho tema colobando o seu peixe na feira das ideias, justo no momento em que se começa a debater, mais ou menos a sério, proposição para criar uma UNIVERSIDADE FEDERAL DO MARAJÓ. Anteriormente, deste mesmo blogue aventamos o que não severia ser e o que poderia ser, paresque, uma universidade contemplando as expectativas da brava gente marajoara.

Eis que vamos adiante frisar alguns pontos oportunos para mestres e doutores refletir antes de "mandar brasa" segundo o costume dos acadêmicos. Vamos lá, aproveitando a maré e agradecendo à História que o tempo da Santa Inquisição acabou, mesmo que monarcas ainda mandam calar a boca a eleitos do povo em certas o casiões, Ou seja, já reinou a liberdade: mas não tanto...

  • Quando a gente fala na "Criaturada grande de Dalcídio", conforme Eneida de Moraes, estamos bem conscientes do fato de que se numa prova de vestibular caísse questão para testar conhecimento sobre que seria a tal criaturada, certamente a taxa de ignorância seria grande mesmo entre professores da disciplina "Culturas Amazônicas"...
  • Povos das águas são conhecidos desde que o mundo é mundo. E, portanto, a transmissão de saberes entre esses povos tradicionais se fez e ainda se faz por tradição oral de geração a geração. 
  • As trocas de informação e conhecimento entre populações não-letradas se faz da mesma maneira que ainda hoje, em grande parte, ocorre no seio de sociedades cultas no interior de famílias entre filhos, pais e avós... De modo que é falsa a noção de que existe uma maneira "atrasada" e outra "adiantada" de comunicar conhecimentos entre as gerações. O que há de verdades são conhecimentos científicos complexos e saber tradicional simples, não raro irracionais (como a astrologia, por exemplo) ou religioso em questão de fé.
  • No caso de uma vasta região ultraperiférica, geograficamente isolada e culturalmente diversa; como o "arquipélago' do Marajó (cercado de águas do mar e dos "sete mil rios" da Amazônia, e florestas inclusive) muito de seu conhecimento tradicional se perdeu. Mas, evidentemente, ainda resta "savoir faire" bastante para pesquisa ciênfica refletir sobre o mesmo e sofisticado de modo justo e compartilhado.
  • A principal questão da Cultura Marajora pré-colombiana, não é de forma alguma a ideia romântica do "eterno retorno"... Mas, sim o teste científico sobre a possibilidade de resiliência ecocultural do bioma: onde o homem e a biosfera teriam ou não capacidade de revitalizar o espaço. 
  • Isto implica uma dupla aposta (como Edgar Morin se refere à aposta de Pascal sobre o outro mundo): depositar esperança da utopia neotropical amazônica e, no fim desta experiência, terá valido a pena - pelo menos - os investimentos educativos, de saúde, turismo cultural, etc. Ou, melhor ainda, comprovar que a ecocivilização que teve seus primòrdio há mais de mil anos pôde enfim ser resgatada e continuada com inovação e criatividade no sentido de uma sociedade regional mais justa e desenvolvida como referência de sustentabilidade para as mais regiões tropicais do planeta.
A crítica prévia que se deve fazer desde já é no sentido da advertência que o coordenador do Núcleo Executivo do CODETEM faz, ao dizer que os ribeirinhos não são coitadinhos... Políticos, assistentes sociais e pesquisadores muitas vezes em suas abordagens para populações tradicionais confundem inclusão socioambiental com populismo. Em vezes de promover a evolução lógica do conhecimento popular para uma ciência e tecnologia tropical complexa...  Entre a possibilidade de uma universidade 'no' Marajó, como qualquer outra no resto mundo, e nenhuma. Não devemos lamentar esta última hipótese: mas redobrar esforços para, exatamente, inventar uma Universidade 'do' Marajó (i.é, o homem do Pacoval como diria Raymundo de Morais).

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