uma pequena semente a germinar na terra de Dalcídio e se transformar numa grande árvore.


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Vila Mangabeira à margem esquerda da baía do Marajó, costa-fronteira do Pará - berço do município de Ponta de Pedras: antiga aldeia das Mangabeiras fundada pelos padres jesuítas e índios catequizados na aldeia Munguba (Barcarena) na primeira sesmaria e fazenda da Companhia de Jesus (São Francisco, em 1686, atual Malato) no rio Marajó-Açu. Distante meia légua acima da aldeia dos índios 'Guaianases' [Guaianá], etnia "nheengaíba" (Nuaruaque); hoje a agrovila Antônio Vieira. 

No ano de 1758, por determinação do Marquês de Pombal em luta contra a Companhia de Jesus, que seria expulsa do Grão-Pará no ano seguinte, todas aldeias teriam seus nomes mudados para toponímia lusitana> A língua geral Nheengatu seria proibida para dar lugar ao ensino do português como língua oficial no Diretório dos Índios (1757-1798). Deste modo entre outras, a aldeia das Mangabeiras chamou-se Lugar de Ponta de Pedras  sob orago de Nossa Senhora da Conceição; e a dos Guaianases virou Lugar de Vilar. tendo São Francisco Xavier como padroeiro.




Nas trilhas do payaçu

"Paris bem vale uma missa", célebre frase do evangélico Henrique de Navarra ao se converter católico, fazendo as pazes entre protestantes e católicos para, finalmente, ser coroado e aceito rei de todos franceses como Henrique IV. O dito nos serve de expectativa a gregos e troianos para assistir missa do Papa Francisco a ser celebrada em visita pastoral ao Marajó se Deus quiser. 

Mais especialmente à gente de Ponta de Pedras no sentido de comungar do ideal de congregação deixado por madre Olvídia Dias como divisa paroquial no frontispício da antiga igreja matriz de Nossa Senhora da Conceição de Ponta de Pedras:"Bem-vindos e vejam que as pedras que somos não estão de ponta mas ligadas entre si". Oxalá assim seja!

Reza a tradição que as tais "pedras" que nós somos de fato estavam de ponta umas com as outras, quando por voltas do ano de 1737, moradores do vilarejo Itaguari sito à margem esquerda do Marajó-Açu e ribeirinhos rio acima com engenhos de aguardente e seus canaviais e escravos, juntaram-se para erguer a nova igreja em pedra e cal. A fim de obter autorização do bispo diocesano de Belém, dom Guilherme de São José; mudando a sede da freguesia da aldeia da Mangabeira, com sua velha capela em taipa de pilão coberta de palhas e deficiência de porto para canoas, para o Itaguari levando a santa imagem da padroeira para o altar-mor da nova igreja, cujo primeiro vigário de acordo com antigos moradores teria sido o padre Navegantes.

Contavam os mais antigos da aldeia velha da beira da baia que, de fato, a dificuldade de porto sempre foi grande obstáculo ao desenvolvimento da Mangabeira. Porém, com a mudança da sede da freguesia para o Itaguari ficaram os pescadores desolados longe de sua santa padroeira. 

Foi assim que nasceu a lenda dos passeios noturnos de Nossa Senhora entre a igreja matriz da beira do rio e a capela junto a praia da Mangabeira. Diziam, antigamente, que certas noites de luar viam passar um vulto branco pela estrada do Campinho rumo ao Santo Lenço que foi o primitivo caminho para a praia muito antes da rodovia que hoje existe. 

Pelas manhãs, diz-que, quando o sacristão ia abrir a igreja da vila de Ponta de Pedras ele observava a barra do manto de Nossa Senhora úmida de sereno da relva e areia da praia nos santos pés da imagem. Um singelo prodígio. A poesia então habitava aquele antigo chão que o romancista Dalcídio Jurandir (Ponta de Pedras, 10/01/1909 - Rio de Janeiro, 16/06/1979) retratou. O pai do escritor, capitão Alfredo Nascimento Pereira, devoto de Santa Rita de Cássia e dono de uma pequena impressora manual; teria escrito relato sobre essa lenda que se perdeu entre outros casos da antiga vila.

Quem primeiro me falou sobre isto foi o prefeito Wolfando Fontes da Silva (Fango), dizendo ele pelo ano de 1962, aproximadamente, que teria quando gestor encomendado a impressão da lenda pelo capitão Alfredo, mas que a edição fora de poucos exemplares que se perderam com o tempo. Resta-nos agora a memória de alguns que morreram mas deixaram livros, como o filho do capitão e o Bernardes (Bernardino Ferreira dos Santos Filho, autor do livro de memórias "Nas margens do Marajó-Açu").

Bom trabalho de preservação do patrimônio histórico e cultural de Ponta de Pedras esta fazendo a Rádio Itaguary, através do programa semanal Café Cultural com o trio bacana Rony Noronha, Sércio Pereira e Ednelson Castro. Um exemplo de boa vontade e trabalho educativo com a comunidade afin com a invenção dos ecomuseus no mundo inteiro. Embora a Radio Itaguary não ouse dizer o nome o que ela faz já é meio caminho andado para algo a ser assumido pela comunidade como futuro Ecomuseu Itaguari, quem sabe. 

Eu tenho convicção de ter plantado boa semente na terra de Dalcídio e que, no devido tempo, essa semente vai germinar e dar uma grande árvore com sombra e bons frutos para todos. Sonho que muitos outros Bernardes contarão suas/nossas memórias, que se propagarão como sementes de samaúma que as mãos do vento semeiam pelas margens da Mangabeira, do Marajó-Açu, rio da Campininha, Paruru-açu, Anabiju, Caramujal, Araraiana, Urinduba, Pacoval, Paricatuba, Curral Panema, Arari e tantas mais comunidades ribeirinhas e nos campos mais distantes da cidade até.

Para encerrar, direi mais que no Centenário do Município (30/04/1978) não tínhamos documento que provasse a data de emancipação política de Ponta de Pedras. O prefeito Antonico Malato havia falecido no cargo e o vice-prefeito Mário Noronha assumiu em condições dramáticas. Um grupo de voluntários se formou em torno do novo prefeito para auxiliar naquela transição, dentre ao qual eu me encontrava no serviço ativo do Itamaraty na Comissão Brasileira de Limites, em Belém. Foi quando o documentarista Jessé Dantas de Feitosa entrou em contato com Ernesto Teixeira para informar que a Fundação Cultural Abaetetubense dispunha de cópia autêntica da Ata de Instalação da nova Vila de Ponta de Pedras. 

Foi então que soubemos que o Centenário havia transcorrido em brancas nuvens, por falta de informação fidedigna. Reunidos com o novo prefeito ponderamos que talvez o Centenário ainda pudesse ser comemorado postumamente levando em conta as circunstâncias. Fomos nos aconselhar com mestre Camilo Viana, da UFPA e SOPREN. Que ele achava? Mário Noronha baixou portaria constituindo a comissão do Centenário e Jessé Dantas de Feitosa ficou encarregado de solicitar da Empresa Brasileira de Correios (EBC) confecção de Selo Comemorativo e impressão de fac-símile da dita Ata. Tudo feito. O documento, segundo Dantas de Feitosa, lhe teria sido confiado pelo prefeito Pedro Boulhosa Sobrinho na esperança de que um dia tivesse, como teve, bom uso sem se extraviar e se perder.

Assim, no dia 30 de Abril de 1980 comemorou-se oficialmente o Centenário transcorrido dois anos antes. Entre as cerimônias o dr. Camilo trouxe da cidade da Vigia um pé de cajuúna ou cajuí (Anacardium giganteum) remetida pelo prefeito Ildone Favacho ao seu colega Mário Noronha como simbolo de amizade entre as duas municipalidades, respectivamente, do Salgado e do Marajó. 

A escolha do lugar para plantar a árvore foi a beira da praia da Mangabeira em frente da casa de Brasilino Rodrigues, um dos mais antigos moradores da comunidade. Coube a Giseldo Fontes filho do prefeito Fango, que fundou a colônia da Mangabeira com migrantes nordestinos da agricultura familiar; plantar o pé de cajuí ou cajuúna. E tudo transcorreu em harmonia e alegria o povo aplaudindo. 

Mas, infelizmente, no mesmo ano sob rigor do sol e do vento aquela muda feneceu sem tempo de esperar pelas chuvas, entretanto nas lembranças o Anacardium giganteum cresceu e deu muitos frutos: um gesto simbólico daquele Centenário que hoje aponta a novas florações da memória da velha aldeia fundada pelos padres jesuítas em 1686 (apud Serafim Leite, História da Companhia de Jesus no Brasil).

Comentários

  1. Parabéns pela postagem! Tenho interesse pelo Marajó, em especial Ponta de Pedras.

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