A AMAZÔNIA É NOSSA.

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Cerâmica Maracá, peça de 34 cm de altura, datada do ano 1.000 no sul do Amapá 
(coleção do Museu Nacional - Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ).

Quando nós vamos erradicar a colonialidade de nossa cultura política e ter desenvolvimento humano bastante para repatriar cada objeto exportado ao seu lugar original de memória? A ilha do Marajó, por exemplo, poderia ser o maior ecomuseu do mundo com seus principais sítios arqueológicos revitalizados e um excelente centro de amostra integrado ao ecoturismo de base na comunidade em O Nosso Museu do Marajó.


A Amazônia É Nossa!

1 - Nossa Amazônia não é nenhum “celeiro do mundo”, como certo dia na bacia do Orenoco o naturalista Humboldt sentenciou, incentivando a exploração predatória e o saque naquele tempo estúpido da máquina a vapor, supostamente para bem da humanidade. 

2 - Doravante, para extirpar a colonialidade todo mundo deverá ter celeiro próprio, auto-sustentável de preferência. E a humanidade de mãos dadas com a Ciência e Tecnologia a serviço dos Direitos Humanos Universais em vez de ser escrava do deus Mercado, vencer o monstro da Fome sem deixar ninguém para trás. 

3 - Nenhum ser humano deveria sofrer a infâmia do trabalho escravo. Não se deve esquecer a Escravidão que desonra a civilização, nem a ingrata sorte dos proletários a trabalhar doze ou até dezesseis horas por dia, a troco de um magro salário até morrer.
Tu dizes não existir inferno? Nunca ouvistes falar do Inferno Verde, não te ensinaram os começos da revolução industrial nem a história das especiarias das Índias com seus miseráveis artesãos e riquíssimos marajás apegados ao sistema de casta graças aos deuses eternos.

4 - Tomás Moro imaginava a ilha da Utopia como modelo perfeito de justiça e liberdade, enquanto os bárbaros e desconhecidos Trópicos pareciam um paraíso comparado às brutais desigualdades civilizadas das zonas frias e temperadas do planeta, porém aos olhos do Ocidente pretos e índios livres eram tidos como bichos selvagens e ervas daninhas nos campos do Senhor.

5 - Antes da "descoberta" da América (aliás, Amerik, "país do vento" em língua maya; região montanhosa às margens do lago Nicarágua) nossos antepassados nativos viviam um comunismo primário em odor de liberdade e a palavra selvagem estava isenta de barbaridade e plena de possibilidades, que nem a revolucionária utopia de Moro chegava perto.

6 - É verdade que antigos ameríndios praticavam antropofagia, mas nenhum antropófago comeu carne humana para saciar a fome e sim para comungar da crença das virtudes mágicas do herói invejado... Se acaso o inimigo caído prisioneiro se acovardasse seria ele imediatamente solto e mandado embora coberta de vergonha como se levasse a peste consigo.

7 - Naquele paraíso perdido, nossa primeira pátria Tapuirama não era casa da mãe Joana que nem no capitalismo selvagem. Nossa Amazônia tapuia ainda hoje é lar natural da Criaturada grande de Dalcídio Jurandir: índios, quilombolas, cabocos, proletários da periferia da Periferia americana... 

8 - Nós chegamos hoje a 40 milhões de habitantes nas regiões amazônicas dos nove países da Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA), dentre todos o Brasil é o maior país amazônico do mundo. Acho eu uma tolice preto ou índio querer provar que poderá fazer qualquer coisa que o branco faz... Claro que pode, mas eu queria ver primeiro o branco fazer o que os pretos e os índios já fizeram. Para início de conversa, há um milhão de anos a negritude criou a humanidade inteira em toda diversidade humana. E o índio ancestral povoou a Ásia para depois chegar a América amanhecente e ainda vazia de gente.

9 - A amazonidade é a resiliência que poderá revitalizar o Brasil gigante adormecido, infundir fé ao esmorecido país do Futuro e ainda, pelo exemplo, dar novo sentido ao mundo todo.

10 - Tampouco as regiões amazônicas são “pulmões do mundo”, mas sim o coração pulsante da mãe Terra. Minuto a minuto, através das artérias da terra, vinte por cento da água doce superficial do planeta flui pelos seios da Floresta Amazônica desde os píncaros dos Andes fecundos até o Atlântico, passando antes ao fluxo e refluxo da maré, pelas verdejantes ilhargas de mais de duas mil ilhas do maior arquipélago fluviomarinho do mundo.

11 - Nós somos o centro nervoso da América do Sol na teia biodiversa da Floresta Chuvosa, aquífero Alter do Chão no imenso subsolo da antiga terra Tapuia, altos rios de chuva sobre nuvens carregadas pelas correntes aéreas movidas a energia solar bombeando, continuamente, umidade de terra e mar; a narrativa das mil e uma lendas de rios sem fim onde não se mergulha duas vezes.

12 - Há mais de cinco mil anos nas terras baixas deste novo mundo, o Homem amazônico foi único artífice da civilização como atesta a Cultura Marajoara: universidade pés descalços na engenharia do barro de mil e quinhentos anos de idade, com suas aldeias suspensas feitas a mão sobre verdes campos inundáveis sob chuvas de dilúvio equinocial na ilha grande entre o mar-Oceano e o grande rio das Amazonas. Esta cobragrande de sete mil quilômetros de comprimento, com a cauda nos confins do Solimões e a cabeça no golfão Marajoara.

13 - Com a acidental chegada de Cristóvão Colombo nas ilhas do Caribe houve começo imediato o genocídio americano e o bravo povo Taino nosso parente se levantou em armas. Porém apesar da bravura dos guerreiros foi grande desvantagem destes diante das armas assassinas dos bárbaros europeus e matilhas de seus ferozes mastins alimentados com carne de índios caçados com animais selvagens. 

14 - Foi assim, desgraçadamente para o Novo Mundo, que de massacre em massacre, de destruição em destruição, mais as devastadoras epidemias de gripe, sarampo, varíola e a sífilis sexualmente transmitida pelos cristãos às índias escravas; em pouco tempo milhões de índios foram reduzidos à miséria e escravidão. A primeira grande obra da ocidental Civilização... 500 anos depois, na festa do Descobrimento na antiga ilha Hispaníola (Santo Domingo), onde começou o martírio dos Tainos e séculos depois os negros do Haiti fizeram a Revolução Haitiana; o Papa pediu perdão dos Índios e dos Negros... Então, de lá pra cá, tudo OK? Todo este horrível crime de lesa humanidade cometido em nome de Cristo e dos Reis Católicos para encontrar o lendário tesouro do El-Dorado e outras riquezas reais e imaginárias. Este é, sem dúvida, o xis da questão da Civilização. E o tal “celeiro do mundo”, rebento industrial da mesma cobiça ocidental; saqueado sem dó nem piedade na periferia da periferia... Nunca foi auditado e contabilizado o custo amazônico real da indústria da Borracha, da Belle Époque, do automóvel e outras invenções de primeiro mundo com matéria-prima e trabalho escravo de terceiros mundos. Quem se importa? Exportar é o que interessa.

15 - O problema mundial é a colonialidade hereditária das mútuas transações internacionais: o vento que sopra lá, também sopra cá... Libertas e serás também.

16 - Euclides da Cunha viajou ao Alto Purus onde ele, na tríplice fronteira Brasil - Bolívia - Peru, viu de perto pra contar de certo os males do isolamento e insalubridade da Floresta Amazônica cantada em prosa e verso. Foi, então, que o escritor de Os Sertões testemunhou o drama do homem amazônico à margem da História, rendido a um destino cruel.

17 - Para os povoadores das fronteiras do imenso interior amazônico, muitas vezes, o velho patriotismo foi antes condenação e castigo injusto. Fado de degredados dos velhos tempos de guerra na Península Ibérica transpostos às colônias ultramarinas. De modo que, mais depressa as gentes fronteiriças deram-se conta que era bem melhor fazer boa vizinhança e construir a Pátria grande que servir de bucha de canhão a monarcas dementes e cortesões alucinados.

18 - É pois chegado o tempo pós-colonial e não faz mais sentido o “celeiro” amazônico e outros celeiros entregues ao saque global irresponsável, quando os povos da Terra restam marginalizados e acorrentados às mesmas misérias de sempre. Apenas 1% da população da Terra se locupleta da maior parte das riquezas do mundo.

19 - Combatentes da esperança estamos nós em marcha para o futuro da sociedade sem classes. Com a força da solidariedade planetária democrática, conscientes da mais valia de todo e qualquer operário, camponês, pescador, extrativista, artesão, artista, cientista independente. 

20 - A Criaturada grande de Dalcídio, o “índio sutil” marajoara, tomamos em nossas mãos a reconquista da Amazônia. Urge o ajuricabano a fim desta gente deixar de ver navios na beira da História. É preciso dar passo avante, criar a universidade da maré com genuína visão pública, gerar uma poderosa economia solidária que se irradie através de todas periferias: fazer valer a opinião cristalina de que o Homem amazônico é, de direito e de fato, cidadão do mundo.

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