Alfredo e o caroço de tucumã




Alfredo, alter ego de Dalcídio Jurandir (Dalcídio José Ramos Pereira), nascido em Ponta de Pedras, ilha do Marajó-PA, em 10 de janeiro de 1909 e falecido aos 70 anos de idade, na cidade do Rio de Janeiro no dia 16 de junho de 1979. A partir da lei nº 9164, de 18/12/2015, da municipalidade de Belém do Pará a data de morte do romancista da Amazônia, imortalizado por sua premiada obra literária, coincidente por acaso com o Bloom's Day; é considerado o DIA DE ALFREDO.


Academia do Peixe Frito e Dia de Alfredo unindo Bruno de Menezes e Dalcídio Jurandir, indissociavelmente, na vida e na morte são as duas faces da negritude amazônida além da melanina... Antilhas e Pará já estavam lá no cerne do circum Caribe antes da chegada dos brancos quase pretos de tão pobres refugiados da nobre Europa e que os poetas Aimé Cesaire da Martinica e Bruno de Belém do Grão-Pará escrevessem, respectivamente, cada um por sua parte as primeiras linhas de Batuque... Ressonância antropoética da ancestralidade da mãe África, nossa senhora do Tempo, cujo milagre natural nos faz a todos e todas afrodescendentes no vasto mundo de Drummond.

Ao psicodrama do caroço de tucumã de Alfredo, quem há de? Decifra-me ou devoro-te!... Do antigo Egito passando pela velha Capadócia, Ulisses no retorno à ilha de Itaca recuperado para a Modernidade e o turismo mundial, em Dublin; pelo Bloom's Day a misturar maluquez com a lucidez de Joyce... No Maranhão e Grão-Pará, o mistério profundo dos turcos encantados esclarecerá talvez, a par da neurociência pós-moderna; o mito pré-natal da amazonidade ou talvez a viagem imaginária ou real do rei mandinga Abu-Bakari II exaltado por vóduns arquetípicos para povoar o imaginário do Haiti, com os índios-pretos descendentes de navegadores negros pré-colombianos e das índias filhas dos rebeldes tainos Hatuey e Guamá guerrilheiros em Cuba; explique a lenda dos três pretinhos da Guiné a surfar vagalhões da Pororoca no golfão Marajoara... O escondido Dom Sebastião migrou direto da batalha perdida no Marrocos para as praias distantes de Pirabas na figura messiânica de Rei Sabá à espera na beira do mar da primeira manhã de uma nova civilização planetária que ainda irá chegar por conta e risco da criatividade da Criaturada grande de Dalcidio. Que sei eu, aprendiz de pajé reprovado por falta de fé?...

Logo nas primeiras linhas do "Chove" ("Chove nos campos de Cachoeira", esboçado em Gurupá em 1929, refeito em Salvaterra em 1939 e publicado originalmente em 1940), primeiro romance do ciclo Extremo Norte, a magia do caroço de tucumã leva o menino Alfredo longe pela vastidão dos campos queimados: o narrador, oculto, diz que o pirralho voltou da caminhada ao chalé, muito cansado... 

Era fim do verão? Sim... As chuvas iriam chegar sem demora e o negrume da paisagem enlutada pelas costumeiras queimadas dos campos de Cachoeira -- como que paisagem de luto parida do mito da primeira noite do mundo --, daria lugar à mudança de tempo que nem os verdes prados da Holanda na primavera. Mas, na anima e ânimo, de Alfredo não... 

Já o filho da preta dona Amélia com o branco velho major Alberto pressentia as agruras do apartheid na província insulana do Marajó? Sem nenhuma dúvida, Alfredo é afrodescendente. Dalcídio, o índio sutil; antropafagicamente, ele quer devorar a cultura europeia paterna? Aprender com seu babalorixá Bruno de Menezes as vozes da mamãe África? Desconverter santos paroquianos tacanhos a fim de lhes confraternizar a ricos e poderosos caruanas e orixás? Para Alfredo tudo é possível quando ele joga com o tempo imaginário tendo o caroço de tucumã mágico em suas mãos, como toda qualquer criança destas paragens perdidas do paraíso que se tornou o inferno verde.



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