400 ANOS DE INVENÇÃO DA AMAZÔNIA: BELÉM DEVE DESCULPAS AO BRAVO POVO MARAJOARA.


Amostra comparativa entre Cultura Marajoara e antiga Civilização Egípcia, no Museu Nacional no Rio de Janeiro, poderia suscitar reflexão nacional sobre cultura e meio ambiente nos dois maiores rios do planeta, nas comemorações dos 400 anos de invenção da Amazônia, em 2016, a partir da fundação de Belém do Pará.


Arte primeva do Brasil, tanga em terra-cota, cultura Marajoara, Museu Nacional / UFRJ.


"A tudo responderam todos conformimente que sim; e só um principal, chamado Piyé, o mais entendido de todos, disse que não queria prometer aquilo. E, como se ficassem os circunstantes suspensos na diferença não esperada da resposta, continuou dizendo que ‘as perguntas e as práticas, que o padre lhes fazia, que as fizesse aos portugueses, e não a eles; porque eles sempre foram fiéis a El-Rei, e sempre reconheceram por seu senhor desde o princípio desta conquista, e sempre foram amigos e servidores dos portugueses; e que, se esta amizade e obediência se quebrou e interrompeu, fora por parte dos portugueses, e não pela sua: assim, que os portugueses eram os que agora haviam de fazer e refazer as suas promessas, pois tinham quebrado tantas vezes, e não ele e os seus , que sempre as guardaram (VIEIRA, 2008, p.422). [carta publicada em 1660 como “Copia de huma carta para ElRey N. Senhor, sobre as missões do Seará, do Maranham, do Pará & do grande rio das Almazonas. Escrita pelo Padre Antonio Vieira da Companhia de Jesu, Pregador de Sua Magestade & Superior dos Religiosos da mesma Companhia naquela Conquista  Lisboa: Officina de Henrique Valente de Oliveira, 1660.”].



Há 360 anos, através de representantes no senado da Câmara de Belém moradores do Pará requereram ao rei de Portugal extermínio e cativeiro dos chamados Nheengaíbas, povos indígenas das ilhas do Marajó, mediante "guerra justa" -- simples pretexto para abastecer de escravos a colônia. Mas, o genocídio anunciado dos Marajoaras poderia ser tiro pela culatra. Varrer do mapa a estulta pretensão pelo irremediável desastre humanitário, evitado graças ao acordo de paz de Mapuá (Breves), de 27 de agosto de 1659, entre sete caciques Nheengaíbas e a Companhia de Jesus, em função legal de tutora dos povos indígenas do Maranhão e Grão Pará conforme a lei régia de 1655, representada no ato histórico pelo superior da Missão padre Antônio Vieira. 

Visto que a guerra justa, caso fosse levada a cabo, como queriam de fato os senhores do Pará àquela época; seria derrota certa, como o padre Vieira tanto avisou. Provavelmente, arrastados à guerra já sem sentido para eles, os combalidos tupinambás sobre os quais os portugueses se fiavam em suas desmedidas ambições; cansados de correrias e vinganças sem fim, desenganados da Terra sem mal jamais encontrada e eles mesmos em vias de caboquização através do catolicismo popular. Se antes, em todo vigor mágico da antropofagia, não puderam os Tupinambás submeter as aldeias nheengaíbas mais próximas à beira; quando mais invadir e ocupar os centros isolados da ilha, grande como os Países Baixos; frente a cerca de até 50 mil Nheengaíbas em pé de guerra contra os portugueses do Pará. 

Estes nheengaíbas (nuaruaques) ao se verem atacados em seu território ancestral, nos meandros do labirinto de infinitos furos e milhares ilhas atravessadas às bocas do Amazonas, conforme costume antigo dos Aruak, certamente iriam se confederar com numerosos parentes Tucujus no Amapá e Parikur no Oiapoque, os quais mais depressa iriam buscar ajuda de armas e munição entre seus compadres nas Guianas inglesa e holandesas, recentemente expulsos da Amazônia Marajoara, entre 1623 e 1647, sob ataque combinado de portugueses e tupinambás

Tanto é verdade, que já nas primeiras décadas do século XVIII, Guamã, cacique dos Aruãs e Mexianas, ainda atacava aldeias de "índios mansos" (escravos) às ilhargas de Belém para com eles para escambo obter armas e munição junto a traficantes franceses na Guiana: donde resultou o furto do café de Caiena pela tropa de guarda costa comandada pelo sargento-mor Francisco de Melo Palheta, homem bom da Vigia, mandado em encalço ao tuxaua bandoleiro.

Hoje são mais de 400 mil marajoaras vivendo na comunidade de dezesseis municípios (Afuá, Anajás, Bagre, Breves, Cachoeira do Arari, Chaves, Curralinho, Gurupá, Melgaço, Muaná, Ponta de Pedras, Portel, São Sebastião da Boa Vista, Salvaterra, Santa Cruz do Arari e Soure). Fora isto, estima-se que dentre três residentes da área metropolitana de Belém um é oriundo de família antiga marajoara, o que representaria quase 500 mil marajoaras. Os quais somados à comunidade marajoara do Amapá e Guianas permite estimar em cerca de um milhão de descendentes de nheengaíbas mestiçados a outras etnias indígenas, negros e colonos europeus no Marajó velho de guerra.

A Academia do Peixe Frito, para manifestar gratidão aos Vereadores da Câmara Municipal de Belém que votaram a favor do reconhecimento desta confraria como patrimônio cultural imaterial do município; contribuindo no quadro das comemorações previstas para os 400 anos da Capital de todos paraenses; vem por este meio sugerir oportunidade para ato especial declaratório de amizade e defesa das tradições marajoaras suplantando para sempre eventuais resquícios do antigo conflito colonial. Ocasião para sessão especial da Casa do Povo belenense com referência à esquecida data histórica de 27 de agosto -- aos 357 anos da paz de Mapuá --  convidando a arqueóloga Denise Shaan, da Universidade Federal do Pará (UFPA), para proferir palestra na CMB com participação de Câmaras Municipais do Marajó, levando em conta contexto histórico das relações da Capital com respeito à Cultura Marajoara pré-colombiana. 

Com este sugestivo ato declaratório a cidade de Belém através de seus representantes eleitos à Câmara de Vereadores estabeleceria diálogo efetivo entre vereadores da região metropolitana, Santana-Macapá, Baixo Tocantins e Marajó em fórum permanente aberto à comunidade para uso democrático e sustentável da Cultura Marajoara na criação de produtos culturais e turísticos visando a promoção do IDH das populações tradicionais do estuário amazônico como um todo.

http://marte.museu-goeldi.br/ecfpn/sites/default/files/DSC05639.JPGFloresta Nacional de Caxiuanã (FLONA Caxiuanã) - Moradia em palafita, população tradicional. Criaturada de Dalcídio Jurandir, nos municípios de Melgaço (antiga aldeia Aricará) e Portel (aldeia Arucará): segundo Antônio Vieira estas duas aldeias foram fundadas com índios Nheengaíbas levados de Mapuá (Breves), em 1659, logo após o acordo de paz de 27 de Agosto.

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