QUANDO A CRIATURADA IRÁ MARCHAR ALÉM DA CORDA DO CÍRIO?

 





MARCHA VIRTUAL DOS VÂNDALOS DO APOCALIPSE

Como os confrades estão lembrados, esta Academia do Peixe Frito e antes Grupo do Peixe Frito, primeiramente se chamou "Vândalos do Apocalipse". Mestres da presepada para combater a empáfia academicista que avassala a província agrominerária do grão Pará e seus herdeiros saudosos da Belle Époque da borracha, devemos ser solidários a moços e moças chamados de vândalos apenas por bagunçar um pouco a ordem tecnoburocrática, burramente, estabelecida. 

Em princípio, nós somos contra todo tipo de violência. Sobretudo, a violência do sistema econômico e político contra os mais fracos e despossuídos que, na história do Pará, deixou marcas profundas na conquista e colonização de nossa região com seu ápice na repressão à Cabanagem. Como conta o monumento do Entroncamento, doado ao Estado pelo arquiteto Oscar Niemeyer representando o "dedo cortado da História". 

Portando, os antigos vândalos da cultura Paris n'América também eles se manifestariam, caso fossem vivos, nesta hora memorável. Muitos jovens insatisfeitos deste país estão em gigantescas passeatas nas ruas. Uma manifestação difusa que, segundo analistas de poltrona, nem mesmo os manifestantes sabem dizer precisamente do que se trata e aonde irá parar. Claro, haverá entre os ditos protestantes alguns que podem saber lá muito bem aonde querem ir e sem as massas não poderiam jamais sair da condição individual onde cada um está.

Para o bem e o mal todos precisamos de todos: do padeiro da esquina, passando pelo cobrador de ônibus até ao coletor de impostos sem os quais não rodam os subsídios dos transportes coletivos, prestações da saúde pública, soldos da PM, proventos do Congresso e da Magistratura. Porém entre caudilhos esclarecidos ou brutos ensandecidos condutores das massas o acordo é fugaz e limitado apenas a mobilizar a moçada, costumeiramente desorientada por anos e anos de alienação ao longo prazo de gerações de avós, pais, filhos e netos descuidados...

Um dia a casa cai. A criaturada sem eira nem beira fica esperta e um Zé Mané qualquer no vero peso da feira, mesmo sem saber, liga por acaso a centelha de uma velha chama, Então, o povão qual inesperada explosão, faz acontecer o novo no impossível chão. Assim são quase todas revoluções paridas da infinita dialética das sucessivas contradições, pela espiral evolutiva, entre a vida e a morte. Inclusive a novidade da internet inventada, dizem, à margem do sistema empresarial em fabriquetas de fundo de quintal ou porta de garagem por moleques meio piratas logo transformadas em megas corporações.

Pelo que mostram imagens do noticiário em geral a imensa maioria dos manifestantes é pacífica e congrega a jovem guarda de classe média. Uma juventude colorida que raramente pega ônibus para ir à faculdade, cinema, shopping center ou às indefectíveis baladas das noites de fim de semana. Então, protestar contra vinte centavos de aumento no preço das passagens de ônibus faz menos sentido para esta turma, do que, por exemplo, se o aumento fosse no preço de combustível para inúmeros automóveis que engarrafam o trânsito entre as diferentes classes de cidadãos brasileiros nas grandes concentrações urbanas do país. 

Ou ainda o rodoviarismo desvairado que tomou lugar das estradas de ferro e da navegação fluvial e costeira. Por tabela, caminhão, automóvel e ônibus numa combinação perversa com o agronegócio multinacional atropelaram aldeias indígenas, quilombos, passaram por cima de vilas e povoados, esvaziando o campo como nos primórdios da revolução industrial, na Inglaterra, o movimento de cercamento (privatização das terras agrícolas) transferiu multidões de camponeses despossuídos de suas terras tradicionais para ser vagabundos nas cidades portuárias onde nasceu o proletariado fumado e mal pago das manufaturas. No Brasil tudo é tardio. A revoluçãõ industrial, a independência, abolição da escravidão, a República, a democratização...

Não podemos nos esquecer que no Brasil enganado pela propaganda anti-comunista articulada pela CIA, notadamente na célebre marcha com Deus, Família e Propriedade; defechou o golpe de estado de 1964 e com o AI-5, em 1968, sob censura e tortura na "ditabranda", poucos jovens sabiam do movimento estudantil de Paris, onde notáveis brasileiros asilados participavam. Ou que, nos Estados Unidos, o movimento hippie acabava convergindo com o pessoal contrário à guerra do Vietnã. Bravo povo que derrotou o colonialismo francês e o imperialismo dos Estados Unidos. É claro que os falcões yankies perderam a guerra primeiramente para o povo dos Estados Unidos mobilizados por pacifistas e esquerdistas à margem do sistema capitalista; e finalmente foram derrotados diante da incrível resistência dos guerrilheiros vietcongs.

Não vamos nós, continuadores dos cabanos de outrora agora por via democrática; cair em tentação de desdenhar a jovem guarda burguesa do patropi em passeata. Nos manuais esquerdistas a palavra 'burguesia' virou palavrão. Todavia, de uma formas ou outra todos moradores do "burgo" (cidade) somos citadinos ou burgueses. Se, por acaso, formos contemplar o modelo analítico marxista seremos, mais uma vez, forçados a concordar que todas periferias do capitalismo (inclusive na Europa e América do Norte), emergentes do colonialismo, não alcançaram desenvolvimento burguês pleno. 

Mas, aí precisamente, entra um certo russo chamado Lênin para avançar na análise prática, demonstrando em 1917 como países retardados na marcha da história podem, sim, dar salto para o futuro integrando campo e cidade pelo atalho da educação libertadora dos trabalhadores. Claro como água da fonte que a classe média nas cidades infartadas pelo êxodo rural, cedo ou tarde, despertam para a realidade de exploração do homem pelo homem. Nem vamos nos aventurar a entrar na Grande Marcha de Mao, que despertou o gigante chinês, sem ele não compraríamos hoje nas barradas das feiras produtos Made in China 1,99 e nem venderíamos nosso rico minério de ferro de Carajás...

Mundo cão apenas com sobrevida devida ao apartheid social impondo leis desiguais para o centro e a periferia com muros, cercas elétricas, sistemas de “segurança”, cãos de guarda, cavalaria, polícia militar, o escambau legal ou ilegal da desigualdade social.

É aí que mora o perigo. Pois a revolta dos injustiçados não raro se confunde com o ódio de classe dos próprios alienados opressores. Massa de manobra para extremismos de direita ou esquerda por razões diferentes e opostas. O homem sendo como é – o animal político de Aristóteles – jamais poderá cortar sua relação genética com a Natureza. A grande alienação das drogas encontra antecedente (Freud explica, ele mesmo dependente de cocaína por curiosidade) no “ópio do povo” patrocinado pela religião arcaica. Ou seja, a contradição básica entre o Homem e a Biosfera que a filosofia da complexidade de um Edgar Morin, por exemplo, pretenderia remediar pregando religar os conhecimentos lembrando que a humanidade é filha da animalidade. Mas, Engels não frisou o fato de que o homem pode estudar e compreender a natureza (inclusive a natureza humana), mas não pode superar a natureza?

O que está acontecendo que os jornais não entendem, que os políticos parecem desorientados, que padres católicos ou pastores evangélicos não acham respostas além de catecismos surrados? Quem por ventura sabe não diz e quem diz não sabe... E, portanto, todos estão muito insatisfeitos de tudo, todos estão indignados contra todos. Os mais velhos, como este escrevinhador inconveniente; não poderão dizer não temos nada com isto. Sim, é verdade, nós devíamos saber e não soubemos. Temos até uma boa desculpa com a Guerra Fria e os anos de chumbo que não soubemos ou não pudemos evitar. Mesmo assim estamos entregando a nossos filhos e netos um mundo em crise como nunca dantes. Cidades horrendas, quando maior pior qualidade de vida para a maior parte dos seus habitantes. Felizmente, há esperança (como sempre) e o nome deste amor é juventude e fé de que há de vir um outro mundo possível.

Porém uma multidão alienada em marcha, reunindo velhos e novos, velhos tontos e novos envelhecidos por maus exemplos; lembra qualquer coisa ainda obscura no suicídio coletivo de certas espécies de roedores cuja explosão populacional à falta de controle colocou em risco a sobrevivência da própria espécie. Ecologistas relatam que os bichos saem da toca em diferentes lugare e se põem em marcha para o mar, andam juntos por quilômetros para se lançar ao abismo do alto dos penhascos para se afogar longe dos lugares onde os mais novos hão de viver. Deste modo espantoso a natureza parece dizer a seus filhos quem, de fato, manda em última instância. 

Uns poucos estão gritando, como o bom burguês Voltaire no século 18: atenção moçada, prestem atenção antes que seja tarde: o mal existe, precisamos cuidar de nossas cidades como se elas fossem pomares e jardim. Cidades humanas enfim. Res publica. Mátria da liberdade, igualdade e da fraternidade que homens e mulheres ainda não viram em suas vidas.



Comentários

Postagens mais visitadas